Há um tempo
em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já têm as formas do nosso
corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam aos mesmos lugares. É o
tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado para sempre à
margem de nós mesmos.
Fernando
Pessoa
Somos os
caminhos que escolhemos percorrer e, mais importante do que chegar ao destino é
saber caminhar até ele: aproveitar as paradas, contemplar o sol diante de nós e
as estrelas que nos guiam no escuro; saborear cada momento da viagem. Mas essa
idéia já foi expressa de diversas formas.
Depois de seguir
um desvio que alterou definitivamente minha rota, percebi o quanto podem ser
importantes e necessários os desvios desse caminho. Separações, perdas, decisões
profissionais... São muitas as escolhas que podem definir ou mudar nossos
planos, a nossa rota. O destino final talvez precise ser revisto...
As tais roupas
a que Fernando Pessoa se refere, que já têm a forma do nosso corpo, foram
importantes; ajudaram em muitos momentos nos protegendo e criando um espaço confortável
que nos dava apoio para viver cada dia. Elas nunca serão esquecidas, haja o que
houver. Mas, às vezes, surgem momentos em que segurança dessas vestes já não nos
cabe: aperta, incomoda.
Não queremos
despir-nos delas, mas, ao mesmo tempo, vislumbramos algo diferente, novo e (por
que não?) melhor. Então nem sempre é possível levar estas tão familiares roupas
conosco e este momento da escolha é sempre difícil. Deixar para trás aquilo que
conhecemos, aquilo com o qual estabelecemos vínculos importantes é deixar para trás
uma parte de si. Quase soa como uma espécie de traição, mas nunca o será, se a
decisão for calcada na sinceridade que podemos e devemos ter conosco.
Desviar da
rota estabelecida anteriormente costuma ser doloroso; pode implicar na tomada
de um trajeto mais longo, mas que pode também ser mais bonito e menos doloroso.
E aí, sim, vale a pena porque haverá flores no caminho a serem admiradas e
frutos suculentos a serem colhidos.
Hoje eu
celebro os bons desvios que existem em nosso caminho porque escolhi um deles e
não me arrependo. É preciso um pouco de coragem (e talvez um pouco de loucura),
mas vale assumir o risco de percorrer uma estrada até então desconhecida quando
a gente sabe muito bem quais são os nossos sonhos e que eles estarão lá quando
chegarmos!