domingo, 26 de agosto de 2012

Somos estradas


Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já têm as formas do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado para sempre à margem de nós mesmos. 

Fernando Pessoa


Somos os caminhos que escolhemos percorrer e, mais importante do que chegar ao destino é saber caminhar até ele: aproveitar as paradas, contemplar o sol diante de nós e as estrelas que nos guiam no escuro; saborear cada momento da viagem. Mas essa idéia já foi expressa de diversas formas.

Depois de seguir um desvio que alterou definitivamente minha rota, percebi o quanto podem ser importantes e necessários os desvios desse caminho. Separações, perdas, decisões profissionais... São muitas as escolhas que podem definir ou mudar nossos planos, a nossa rota. O destino final talvez precise ser revisto...

As tais roupas a que Fernando Pessoa se refere, que já têm a forma do nosso corpo, foram importantes; ajudaram em muitos momentos nos protegendo e criando um espaço confortável que nos dava apoio para viver cada dia. Elas nunca serão esquecidas, haja o que houver. Mas, às vezes, surgem momentos em que segurança dessas vestes já não nos cabe: aperta, incomoda.

Não queremos despir-nos delas, mas, ao mesmo tempo, vislumbramos algo diferente, novo e (por que não?) melhor. Então nem sempre é possível levar estas tão familiares roupas conosco e este momento da escolha é sempre difícil. Deixar para trás aquilo que conhecemos, aquilo com o qual estabelecemos vínculos importantes é deixar para trás uma parte de si. Quase soa como uma espécie de traição, mas nunca o será, se a decisão for calcada na sinceridade que podemos e devemos ter conosco.

Desviar da rota estabelecida anteriormente costuma ser doloroso; pode implicar na tomada de um trajeto mais longo, mas que pode também ser mais bonito e menos doloroso. E aí, sim, vale a pena porque haverá flores no caminho a serem admiradas e frutos suculentos a serem colhidos.

Hoje eu celebro os bons desvios que existem em nosso caminho porque escolhi um deles e não me arrependo. É preciso um pouco de coragem (e talvez um pouco de loucura), mas vale assumir o risco de percorrer uma estrada até então desconhecida quando a gente sabe muito bem quais são os nossos sonhos e que eles estarão lá quando chegarmos!