domingo, 25 de novembro de 2012

Um caminho a dois


"Se o mundo lhe abandona, a solidão é tolerável, mas se você mesmo se abandona, a solidão é insuportável!"
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- Como foi o seu dia?
- Foi ótimo!
- Como, ótimo? Você passou o dia inteiro sozinha, enfiada nessa casa!
- Ué, eu sou uma ótima companhia para mim mesma!

O diálogo é verídico e minha resposta foi espontânea, nem um pouco planejada. Dias depois fiquei refletindo sobre ela... É muito importante ser uma boa companhia para si! Eu sou o único ser que vai estar comigo durante TODAS as 24 horas de TODOS os meus dias! A vida fica complicada demais quando a gente não consegue se acompanhar...


Nem sempre fui uma boa companhia para mim mesma. E acredito que seja impossível o ser o tempo todo, mas é plenamente possível o ser pelo menos por uma boa parte do tempo que dispomos por aqui, desde que se disponha de vontade e paciência para conhecer-se, dialogar consigo, reconhecer em si fraquezas, imperfeições e trabalhá-las com amor, com todo o cuidado que se possa ter com uma pessoa; sem, contudo, menosprezar as próprias fortitudes.

Estou falando de um processo que se pede constante, que é para uma vida. E quando o experienciamos dessa forma é que o mais belo encontro com o outro poderá se dar. Porque assim iremos expor e confiar ao outro o que há de mais valioso em nós, não porque precisamos, mas porque queremos. Não porque seria impossível viver de outra forma, mas porque, dessa forma, a vida será melhor, será mais.

Muitas pessoas não entendem a coragem e a ternura que residem na frase: “eu sou tua” – e coloco no feminino, pois aqui estou expressando um ponto de vista muito meu, mas sabe, quando essa frase é proferida por um homem, acredito que exista nela um valor diferente e, em certa medida, mais intenso, dada nossa cultura que sempre defendeu a camuflagem dos sentimentos e emoções mais legítimos do gênero masculino.

“Eu sou tua” não implica numa concessão de território; implica numa entrega espontânea que é, na realidade, um convite ao compartilhar. Quando digo ao outro “eu sou tua” não estou entregando a ele o poder absoluto sobre minha vontade ou minhas ações. Estou reiterando um vínculo afetivo, um compromisso de amor. O subtexto desta frase seria: “quero que você permaneça na minha vida, quero que você me conheça, quero lhe conhecer e reconhecer as mais sutis nuances que você permitir. Eu escolhi você”.

Dessa forma, quem diz “eu sou tua” é senhora de seus sentimentos e da opção de, mais tarde, caso assim o entenda e se perceba, dizer: “não lhe quero mais”. Não se trata aqui de uma entrega definitiva e incondicional, pois aquele que recebe precisa assumir a responsabilidade de cuidar, assim como também é dono da possibilidade da recusa. O que entendo não ser permitido é aceitar isentando-se desse encargo. Aquele que o faz, está fadado à perda.

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Trajetória de emoções

É engraçado como certos textos encontram lugar permanente na memória. Há alguns anos, no tempo em que aquela série E.R ainda apresentava temporadas inéditas, foi exibido o capitulo do casamento de Abby e Luka (curioso como a tradução da legenda foi mais feliz do que as traduções que encontrei na Internet...).

No momento dos votos, Abby citou esta poesia que, acredito, muitos fãs de E.R jamais esqueceram:


I carry your heart with me
E. E. Cummings

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I carry your heart with me
(I carry it in my heart)
I am never without it
(anywhere I go you go, my dear; and whatever is done
by only me is your doing, my darling)
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I fear no fate
(for you are my fate, my sweet)
I want no world
(for beautiful you are my world, my true)
and it’s you are whatever a moon has always meant
and whatever a sun will always sing is you
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here is the deepest secret nobody knows
(here is the root of the root and the bud of the bud
and the sky of the sky of a tree called life; which grows
higher than the soul can hope or mind can hide)
and this is the wonder that’s keeping the stars apart
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I carry your heart (I carry it in my heart)
.
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Abençoados sejam todos aqueles que entendem o amor de um modo tão doce como esse texto expressa.

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

As pontes do caminho


É engraçado como aquele que a gente cativou pode voltar depois de tanto tempo longe...  Às vezes a distância, quando persiste por anos, causa uma sensação de que a amizade acabou e a gente até passa por uma espécie de luto. Lamentamos não ter mais aquele amigo para emprestar o ombro aonde muitas lágrimas um dia chegaram a cair; ou para celebrar junto um acontecimento alegre, uma conquista importante.

E aí algo acontece; um desvio se apresenta... A coragem necessária vem, a gente segue aquele rumo incerto e algo muda. E é como se essa coragem se desdobrasse e te inspirasse a agir porque você sempre soube que pegar aquele desvio implicaria necessariamente em procurar aquela pessoa. Você tinha que dar o primeiro passo porque foi exatamente você – por razões que hoje já não fazem o menor sentido – que deu inúmeros passos para trás, afastando-se do amigo que já havia percorrido com você tantos caminhos na mesma estrada.

E por um momento parece que não existiram hiatos, que o tempo não passou. Ele está ali, diante de você, contando coisas de sua vida e das traquinagens que os filhos andam aprontando, como se fosse uma ocasião trivial. Dizem que só o amor consegue criar pontes assim, que atravessam não só as distâncias, mas o tempo também, resgatando uma afinidade e um sentimento de “tudo bem, agora eu posso ser eu”, de falar do cotidiano e ser bom porque quem está ouvindo te entende, te apóia e não te julga (por mais que discorde de um monte de bobagens de você conte).

Tempo e distância podem fazer muitas relações mudarem, mas esse amor consegue criar uma atmosfera de eterno. Não se pode esperar que as coisas voltem a ser como antes porque esse estado de “ser como antes” não existe, é uma fantasia da nossa cabeça. Mas talvez seja possível recomeçar de outra forma, do ponto em que (se) parou.

São pessoas assim, esses irmãos de pai e mãe diferentes, que dão cor e aroma especiais à nossa vida. Há muitas “frases feitas” por aí dizendo que amigo é o irmão que a gente escolhe, mas eu não acredito nisso. O amigo que, ao seu lado, faz nascer esse tipo de amor que transcende tempo, espaços e erros não se escolhe, se reconhece.

E assim, meus desvios fizeram com que eu pudesse novamente contar com a presença de alguém que tanto me fez falta, que sempre foi, mesmo quando eu não pedia, o irmão mais velho, conselheiro, aquele que me puxava de volta para a realidade quando eu ficava perdida em devaneios ou me acalmava com a voz tranquila durante as mais difíceis perdas.

Fez falta. A gente sobrevive longe? Sem contato? Claro, a gente sobrevive diante das mais áridas situações. Mas não é tão legal, porque é sobreviver. Não se trata aqui de uma necessidade básica, fisiológica, mas de um querer incondicional da emoção.



sábado, 15 de setembro de 2012

Peguei um desvio, olhei para cima e vi o sol.

Uma coisa interessante que aprendi fazendo uma disciplina de psicanálise é que esta teoria coloca que é a falta que nos move; é a busca por suprir algo que não sabemos (e nunca iremos, de fato, saber) que nos faz construir estruturas que cercam nossa vida: trabalho, estudo, relacionamentos, critérios de consumo... Ou, se mal conduzida, pode tornar-se causa de uma série de patologias emocionais.

Em outro momento, em outra sala de aula, meu professor da disciplina de Imagens, Mito e Discurso discorreu sobre o significado da luz do sol nos mitos de civilizações antigas. Quando nessas histórias se fala da luz ou do próprio sol, está-se, na verdade, fazendo referência a um conhecimento sagrado, proibido e fora do alcance dos mortais. Aquele que infringe regras e ousa não só roubar um pedacinho de luz, mas partilhá-lo com os seus é o personagem considerado subversivo, revolucionário – o “herói”.

Olhei para o céu e vi o sol tão longe... Mas um pedacinho de luz chegou a mim e eu o guardei. Aconteceu dessa forma comigo: em meio a uma campanha eleitoral; mas pode acontecer de muitas formas com outras pessoas. O importante é não deixar esse facho de luz se perder.

Ainda que nunca venhamos saber qual é esta verdadeira falta, que estaria situada nos recônditos mais profundos do inconsciente, é possível definir um caminho onde as tentativas de supri-la permeiem ações que fortaleçam mente e emoção, que a cada novo dia nos ensine algo novo e maravilhoso nessa tão singular condição de ser não só humano, mas de “ser social”.

Então é preciso guardar a centelha de sol que nos abraça, cultivá-la com carinho e dividi-la com os que estão ao nosso redor, para que assim ela se multiplique e se torne cada vez mais intensa, pois com essa luz inspiradora podemos forjar um poder que transforma realidades, que nos mostra todo dia, dia a dia, que nada, mas nada mesmo, é impossível de mudar.



domingo, 26 de agosto de 2012

Somos estradas


Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já têm as formas do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado para sempre à margem de nós mesmos. 

Fernando Pessoa


Somos os caminhos que escolhemos percorrer e, mais importante do que chegar ao destino é saber caminhar até ele: aproveitar as paradas, contemplar o sol diante de nós e as estrelas que nos guiam no escuro; saborear cada momento da viagem. Mas essa idéia já foi expressa de diversas formas.

Depois de seguir um desvio que alterou definitivamente minha rota, percebi o quanto podem ser importantes e necessários os desvios desse caminho. Separações, perdas, decisões profissionais... São muitas as escolhas que podem definir ou mudar nossos planos, a nossa rota. O destino final talvez precise ser revisto...

As tais roupas a que Fernando Pessoa se refere, que já têm a forma do nosso corpo, foram importantes; ajudaram em muitos momentos nos protegendo e criando um espaço confortável que nos dava apoio para viver cada dia. Elas nunca serão esquecidas, haja o que houver. Mas, às vezes, surgem momentos em que segurança dessas vestes já não nos cabe: aperta, incomoda.

Não queremos despir-nos delas, mas, ao mesmo tempo, vislumbramos algo diferente, novo e (por que não?) melhor. Então nem sempre é possível levar estas tão familiares roupas conosco e este momento da escolha é sempre difícil. Deixar para trás aquilo que conhecemos, aquilo com o qual estabelecemos vínculos importantes é deixar para trás uma parte de si. Quase soa como uma espécie de traição, mas nunca o será, se a decisão for calcada na sinceridade que podemos e devemos ter conosco.

Desviar da rota estabelecida anteriormente costuma ser doloroso; pode implicar na tomada de um trajeto mais longo, mas que pode também ser mais bonito e menos doloroso. E aí, sim, vale a pena porque haverá flores no caminho a serem admiradas e frutos suculentos a serem colhidos.

Hoje eu celebro os bons desvios que existem em nosso caminho porque escolhi um deles e não me arrependo. É preciso um pouco de coragem (e talvez um pouco de loucura), mas vale assumir o risco de percorrer uma estrada até então desconhecida quando a gente sabe muito bem quais são os nossos sonhos e que eles estarão lá quando chegarmos!